PONTO DOS VOLANTES – Aos prantos, a doméstica Olinta Alves Gonçalves lamenta o destino do filho, de 17 anos, que se tornou viciado em crack e, depois de trazer muitos problemas para a família, foi encaminhado a uma clínica de recuperação em Belo Horizonte , a 635 quilômetros do lugar onde mora, o pequeno (e pobre) município de Ponto dos Volantes, de 10,7 mil habitantes, localizado no Vale do Jequitinhonha e que tem Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,594. “Não esperava que meu filho fosse encontrar crack aqui, mas, descobri que existia uma boca de fumo na minha rua”, lamenta a doméstica.
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Aos 28 anos, Fernando
garante que quer se livrar do crack.
Por causa do vício, cometeu roubos e assaltos, foi preso e acabou baleado |
Como Olinta, muitas outras mães e pais foram surpreendidos com a epidemia do crack que se espalhou rápido pelo país. Levantamento da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) que será apresentado hoje, em Brasília, revela que 63,7% de 4.400 municípios pesquisados enfrentam problemas de saúde decorrentes da droga, que, conforme estudo anterior realizado pela própria CNM, está presente em praticamente todas cidades pesquisadas (98%).
O crack deixou de ser problema apenas das grandes cidades – onde as pessoas há muito convivem com o alto consumo da droga – e invadiu municípios pobres, com baixo Índice de Desenvolvimento Humano. Essa realidade é facilmente constatada no Vale do Jequitinhonha, a região mais carente de Minas e uma das mais pobres do país. Moradores do vale sempre conviveram com a seca, o desemprego e a miséria. Agora, junto com a falta de expectativa de melhorias, enfrentam o problema do crack, cujos efeitos devastadores não se restringem à saúde dos viciados e atingem em cheio a estrutura familiar.
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Olinta Alves não consegue conter o
choro ao falar do drama do filho,
de 17 anos, usuário de crack
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Formado em enfermagem e com pós-graduação em tratamento de dependência química, Abrão desenvolve um trabalho de combate às drogas e o encaminhamento de viciados para centros de recuperação em 12 municípios do Jequitinhonha. “Em todos eles já existe o crack, que chegou até a zona rural”, assegura Abrão, que faz palestras para estudantes dentro do Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (Proerd), da PM. Em pouco mais de cinco anos, ele já levou mais de 200 adolescentes e jovens para centros de recuperação. “Como o comércio é fácil e os jovens se viciam rapidamente, o crack atraiu muito o interesse dos traficantes, pela possibilidade de lucro fácil”, diz o militar.
Curiosidade
“Experimentei o crack por pura curiosidade, aos 15 anos. Desde a primeira vez que usei, virei viciado. Acabou com minha vida”, declara Fernando (nome fictício), de 28, morador de Itaobim. Na cidade, de 20,9 mil habitantes e IDH de 0,689, também às margens da BR-116, o consumo da droga se multiplica e amplia a violência por conta da formação de gangues de adolescentes e jovens.
“Crack é uma ilusão. Quando a gente usa a primeira vez, dá uma sensação que dura de
“Já usei vários tipos de droga, como maconha e cocaína. Mas os efeitos do crack são mais destruidores”, diz. “O conselho que dou é que ninguém ponha uma pedra de crack na boca. Se fizer isso, vai perder tudo, como eu perdi”, acrescenta.
Menino de 14 anos é viciado em crack desde os 11
"O TRAFICANTE DISSE QUE ERA BOM"
Em Araçuaí, um menino de 14 anos, franzino, tranquilo, aparentemente sem problemas, fala sobre o vício em crack e seu sofrimento. Por conta das drogas, abandonou a escola. Já esteve internado em um centro para viciados, em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, mas voltou a consumir crack. Diz que usou a droga pela primeira vez aos 11 anos, ao aceitar uma pedra oferecida pelo traficante, e acabou se viciando.
Na sua casa, também um irmão, de 16 anos, é usuário e, como ele, largou os estudos.
Foi um cara aí. Eu estava com um dinheiro no bolso. Aí, ele me ofereceu para vender e falou que era bom.
Você tinha quanto no bolso?
Uns R$ 10.
Deu para comprar o quê?
Uma pedra.
Você tinha quantos anos?
11 anos.
Você quer deixar o vício?
Quero.
Quem vende o crack aqui na cidade?
Não sei, não sei não.
O que você recomenda para outros garotos da sua idade quando alguém oferecer uma pedra de crack?
Não devem nem olhar, e não aceitar.
Fonte: Luiz Ribeiro - Estado de Minas
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